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UMA QUESTÃO DE SENSIBILIDADE

Num dia desses do mês de junho de 2015, passando ao lado da Catedral da Sé, na cidade de São Paulo, eu e minha companheira Claudia, vimos um garoto deitado no chão, ao lado da igreja, completamente drogado. Ele devia ter no máximo de 15 anos de idade, não mais que isso, era muito jovem. Ficamos indignados e da minha parte, naquele dia, permaneceu um incômodo que me acompanhou e por isto resolvi escrever este artigo.

A praça está tomada por viciados e a população passa por eles sem notá-los, pois eles se tornaram algo parecido com as pedras do calçamento, que são pisadas e não percebidas. São elementos da paisagem, elementos grotescos, que não merecem ser reparados, que não nos dizem respeito. Todos passam por eles, apressados (São Paulo é uma cidade apressada), e ninguém desvia o olhar, nem um pouquinho sequer, da sua trajetória, para observá-los, ainda que de relance.

Enquanto professor, nas minhas aulas, dirigidas a um público seleto de pós-graduandos (mestrado e doutorado), eu tenho repetido a mesma pergunta para cada turma nova: quem aqui não tem nenhum membro na família que esteja na condição de usuário de drogas? A maioria deles, às vezes a totalidade, permanece calada, em silenciosa confirmação. Eis a conclusão que cheguei há algum tempo: hoje, a toxicomania tornou-se epidêmica, espraiou-se por toda a sociedade, toda mesmo, independente da origem social de cada um dos adictos. Ouso chamá-la de epidemia do século XXI.

Como é possível que ainda tenha tanta gente que considera o consumo de drogas como caso de polícia e não de saúde pública, como de fato ele é? Essa mudança de enfoque é mais que necessária para que se possa efetivamente dar um salto de qualidade no combate a essa epidemia, que, nos dias de hoje, atinge todos os extratos sociais, indistintamente, em todo o território nacional.

A droga é um elemento já posto para a sociedade contemporânea. Eu a considero como um aprofundamento (um mergulho nas profundezas do negativo) das características maléficas da moderna sociedade de consumo. Neste sentido, eu reproduzo aqui o meu artigo Keep Walking: Como Sutilmente o Mercado Produz a Brevidade das Coisas ou Como as Pessoas Estão Ficando Cada Vez Mais Hedonistas e Individualistas, com o objetivo de deixar bem clara esta minha consideração. Ao fazê-lo, sei que corro o risco de ser considerado careta (conservador) pelos mais libertários, é um risco... Ao artigo!

Keep Walking: Como Sutilmente o Mercado Produz a Brevidade das Coisas ou Como as Pessoas Estão Ficando Cada Vez Mais Hedonistas e Individualistas

Na crônica O Roubo da Bola de Capotão eu falei sobre a criação contínua de desejos na economia de mercado dos dias de hoje. O lançamento de novos produtos todos os anos, tornando os anteriores obsoletos, tornou-se a forma de ser do mercado. Criou-se uma orgia consumista que envolve uma complexa estrutura de marketing e propaganda a serviço da indústria. Praticamente a grande maioria da propaganda foca nos prazeres imediatos como forma de apelo às compras; os apelos de caráter erótico são bons exemplos disso (existe apelo mais imediato que esse?).

Há algumas décadas os meios de comunicação associados aos marqueteiros têm plasmado sub-repticiamente a ideia de que devemos consumir rápido, tirando o máximo proveito dos bens de consumo hoje, pois novos estão por vir num futuro próximo. No mercado da informática isso fica muito claro, pois ficamos sempre correndo atrás dos lançamentos todos os anos. Na indústria da moda isso virou rotina há muito tempo, há muitas décadas, e as coleções são lançadas ano a ano, conforme as estações do ano, ininterruptamente.

Tamanho massacre midiático não poderia deixar de produzir estragos comportamentais nos consumidores. Os mais jovens, que já nasceram dentro desse esquema tendem a viver na superfície e no imediatismo. A busca do prazer imediato tornou-se algo normal, tornou-se a forma de ser das novas gerações. O mercado está produzindo um ser humano essencialmente hedonista: viver significa buscar o máximo prazer, o tempo todo e em todo lugar. É óbvio que isso não é possível, a vida não é assim, não é um banquete orgiástico permanente.

Um bom exemplo disso é o incentivo ao consumo de bebidas alcoólicas. Já notaram que as propagandas de cerveja são, em sua maioria, voltadas ao público jovem, com chamamentos erotizados? Se ainda não notaram, observem. O máximo de prazer em cada garrafa e, quanto mais garrafas, mais e mais prazer, esta é a ideia subjacente nas entrelinhas de cada apelo publicitário. Do consumo de bebidas, que em termos de prazer tem seus limites bastante estreitos, para o consumo de drogas ilícitas, cujos limites são bem mais largos, é um pulo, um pulo bem curtinho. As drogas proporcionam um prazer imediato bem mais intenso. Se o objetivo é a busca pelo maior prazer o mais rápido possível, as drogas estão aí para isso, ou não? Os nossos jovens apenas estão buscando o que lhes é sugerido todos os dias pela propaganda e pela indústria. Eles são conduzidos a isso e depois são criminalizados por isso. Como eu já disse no artigo citado acima: a HIPOCRISIA é a grife número um do mercado.

As bebidas alcoólicas são vendidas à luz do dia, legalmente, e as outras drogas são vendidas às escondidas pelo crime organizado, que se enraizou em todos os extratos da sociedade, em todas as classes sociais, assim como os consumidores de drogas ilícitas; a toxicomania virou um grande negócio e movimenta fortunas diariamente. A propaganda de bebidas alcoólicas, com destaque para as cervejas, que são ofertadas como se não o fossem, abrem caminho para as drogas ilegais de forma subliminar, quando vende a ideia do logo, do eterno agora, da felicidade já.

Quando é o momento de consumir bebidas? É agora, a todo momento. O prazer está no consumir e elas não podem fazer mal algum; vejam o perfil dos consumidores: rapazes e raparigas sarados, sensuais, alegres e despreocupados! A propaganda chama os jovens a entrarem nessa tribo, que podemos chamá-la de Tribo do Agora, cujo lema é: não deixe para consumir depois o que você pode consumir nesse instante. O seu grito de guerra é: já! já! já!

As propagandas não incentivam só o hedonismo, elas também propõem um estilo de vida individualista, onde você se tornará, o melhor, o mais visível, o único, consumindo os produtos que são anunciados para todos e que serão consumidos por muitos. É um paradoxo, mas a sociedade de consumo é mesmo paradoxal: como alguém pode ser diferente ao consumir uma ou outra marca anunciada que muitos consumirão? Um consumista contumaz responderia que ele está seguindo a onda, a moda. Bom, se ele segue a onda, ele é apenas mais um seguidor. Ser diferente é seguir a onda? Acho que o consumismo emburrece as pessoas...

Um ótimo exemplo de propaganda que incentiva o individualismo é a do uísque escocês Johnnie Walker, que é a marca de uísque mais distribuída no mundo, sendo vendida em quase todos os países. Bem, a linha de uísques da Johnnie Walker (Johnnie Walker White Label, Johnnie Walker Red Label, Johnnie Walker Black Label, Johnnie Walker Green Label, Johnnie Walker Gold Label e Johnnie Walker Blue Label) não é acessível a todos por conta do preço, mas mesmo assim é muito acessada, a exclusividade é bem relativa. Todavia, consideremos que ela é mais acessível aos extratos de maior renda, deixando muitos consumidores de bebidas alcoólicas de fora por conta das restrições financeiras.

O slogan da Johnnie Walker é Keep Walking, que em português significa continue andando, é um elogio ao homem que caminha em frente, sem parar, convicto da sua trajetória solitária, despreocupado em relação ao seu entorno; o que importa é ele próprio e o seu contínuo caminhar. Em português temos uma expressão para isso: cagando e andando. A expressão popular explica a proposta da propaganda de forma cristalina: ande para frente, seguro do seu caminhar e não se afete com os que estão no seu caminho, apenas caminhe, caminhe sempre, sempre em frente: simplificando: cague para todos (desculpem a expressão chula).

Olhando para as propagandas de bebidas de forma geral, é possível concluir que elas, através de apelos sensuais e individualistas, incentivam o desenvolvimento de dois vícios graves para a convivência dos seres humanos em sociedade: o hedonismo e o individualismo. Na verdade, ambos são irmãos inseparáveis, pois eles se alimentam mutuamente. Uma sociedade baseada nos prazeres imediatos e no individualismo consumista tenderá a se degradar; parece que, neste momento, estamos vivendo um processo de degradação, onde os vícios são colocados acima das virtudes. A sociedade de consumo com a sua máquina publicitária propaga, o tempo todo, elogios e mais elogios ao vício. Gostaria que me provassem o contrário ou que, pelo menos, me compreendessem, pois é muito angustiante chegar a esta conclusão de forma solitária.

 
   
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