OS ARCANOS MAIORES DO TARÔ EM POEMAS: O LOUCO
O LOUCO (primeira versão: superfície)
Estou aqui
Ou ali
Ou acolá
Se me querem fico
Senão me vou
E fico
E vou
É bem assim que sou
Bem aqui aonde estou
Na minha trouxa carrego
Tudo de nada
Nada de tudo
Tudo de tudo carregar
A cabeça não me faz
Minha cabeça de vento
Leve ao vento
Leva o vento
Sempre pronto para dar
A minha mortal pirueta
E voltar
E ir
E voltar
E a minha própria sombra enganar
Não tenho rabo
Como meu cachorro tem o seu
Mas sempre atrás dele corro
Como ele atrás do seu
Suspeito que ele lá está
Sempre... sempre a me espreitar
Que me olhem
Que se espantem
Gargalho e sigo hoje
Como ontem
Em algum lugar posso parar
Mas gosto mesmo é de andar
Distraído... distraído...
Bambeando
Para lá e para cá
A beira do precipício
Sem medo do fundo vazio
Se caio
O corpo desce à terra
E o espírito alça voo
Rumo ao infinito e além
Nada ter
Nada a temer
O que perder?
Distinta plateia
Aplausos!
Aplausos!
Clap! Clap! Clap!
Senhoras e senhores
O espetáculo vai começar
E o palhaço o que é?
Ele é: é trelelé!
E chega de trololó!
O LOUCO E O TARÔ (segunda versão: profundidade)
Na minha cabeça carrego o vento
Na minha trouxa carrego o vazio
Nas minhas pernas carrego caminhos.
Minhas roupas são bem mais velhas
Que minh'alma leve e solta
Alma que vaga para lá e para cá.
Caminho como assombração no mundo
Brincando sem compromissos
Sempre pronto para mudar a rota.
Meu cachorro me segue fiel
Canina fidelidade e puro afeto
Nada lhe peço e tudo ele me dá.
Sigo meus passos como quem vai
Sempiternamente a lugar nenhum
Todos os lugares são lugares meus.
Minha loucura é o ingênuo susto
De quem ainda não se encaixou
No mundo dos quereres e fazeres.
Andarilho, caminho sob a luz do Sol
Mas, lunático que sou, tenho a cabeça
No mundo secreto da Lua noturna.